O que faz a diferença

Para ensinar não basta conhecer a matéria.
É preciso estudar, reciclar-se e motivar os alunos

Ariel Kostman

 
Nossa Senhora das Graças: alunos da 3ª série do ensino médio utilizam máscaras em projeto que mistura filosofia, artes e psicodrama

Os especialistas em educação divergem em muitas coisas. Uns acreditam que cabe à escola priorizar a transmissão de conteúdos, enquanto outros defendem que o mais importante é ensinar o estudante a refletir, a ter espírito crítico. Existem os que valorizam a individualidade e a quantidade de informações que os alunos conseguem absorver e os que preferem estimular a cooperação e o raciocínio lógico. As diferenças são intermináveis, exceto em um ponto sobre o qual todos concordam: sem bons professores, não há como ter um ensino de qualidade.

Mas, afinal, quais os requisitos necessários para ser um bom educador? Hoje, já não bastam o diploma de uma respeitável faculdade e o pleno domínio da matéria ensinada. Tão importante quanto isso é saber transmitir o conhecimento de uma maneira estimulante, capaz de prender a atenção de uma classe. Esse é o segredo, o diferencial entre o bom profissional e o mediano. A tarefa é cada vez mais desafiadora. Atualmente, crianças e adolescentes dispõem de uma série de fontes de informação e aprendizado fora da escola, como a televisão e a internet. Mais do que nunca, o professor tem a necessidade de se atualizar permanentemente por meio de leituras, cursos e congressos. Deve dominar a informática – não apenas para manejar o computador, mas para utilizá-lo como instrumento efetivo de aprendizagem. Espera-se ainda dele capacidade para estabelecer relações entre seu trabalho e o dos colegas. Só assim a escola poderá obter bons resultados em projetos interdisciplinares.

Ensaio de música no Miguel de Cervantes: quatro aulas de arte por semana

Como reunir tantas competências ao mesmo tempo? Antes de mais nada, pelo esforço pessoal. É igualmente indispensável que o colégio dê a seus professores condições e tempo para se aperfeiçoar. Na maioria dos casos, porém, não é o que acontece. "As escolas exigem cada vez mais que o professor faça cursos, se atualize", diz Celso Napolitano, vice-presidente do Sinpro, sindicato que reúne os professores da rede particular de São Paulo. "Só que nem sempre elas querem pagar por isso." Se as exigências aumentaram, os salários, na maioria das escolas privadas, também cresceram. Segundo dados da CNA, a maior consultoria especializada em educação do país, nos últimos dez anos a categoria teve aumentos salariais de até 80% acima da inflação. Existem cerca de 20 000 professores nas escolas particulares de São Paulo, de acordo com o Sinpro. Desse total, 70% são mulheres. A média de idade é de 37 anos.

Além de fazer com que a matéria desperte o interesse dos estudantes, o bom educador é aquele que consegue incorporar às aulas assuntos do dia-a-dia que estão na cabeça dos alunos. Em 24 horas, por exemplo, os atentados terroristas nos Estados Unidos viraram o tema das aulas de história da Escola Nossa Senhora das Graças, mais conhecida como "Gracinha", no Itaim Bibi. "A partir dos atentados, vamos desenvolver temas como globalização e blocos econômicos", conta a professora Conceição Aparecida Cabrini. Uma das autoras da coleção didática História Temática, composta de quatro volumes e adotada em diversos colégios da capital, Conceição procura ligar suas aulas a fatos do presente. Para ela, deixou de haver espaço para o professor à moda antiga, fechado a novos métodos e tecnologias. "Na nossa profissão não se pode parar de aprender nunca", afirma.


Alunas da 8ª série do Santa Cruz: aprendendo com jogo de cubos em aula de matemática

É justamente por esse motivo que a Escola Vera Cruz mantém um centro de formação que oferece cursos de capacitação e aprimoramento. Ao freqüentá-los, os professores são remunerados como se estivessem dando aulas. No Etapa, um dos colégios com maior índice de aprovação nos vestibulares mais concorridos, 90% do corpo docente trabalha em regime de dedicação exclusiva. Muitos professores do cursinho homônimo lecionam simultaneamente na escola, o que beneficia os alunos com técnicas de ensino mais dinâmicas. No magistério, como em qualquer profissão, o salário tem um peso importante na hora de escolher em que escola trabalhar. Mas, muitas vezes, não é o fator decisivo. "Existem colégios que deixam o educador criar", diz o professor Luiz Augusto Mardegan, que leciona filosofia na Escola Nossa Senhora das Graças. "Trata-se de um diferencial que motiva e segura o professor na instituição." Mardegan desenvolve em sua escola, com estudantes da 3ª série do ensino médio, um projeto que mistura filosofia, arte e psicodrama. Durante o ano, os alunos criam máscaras nas quais são projetadas características pessoais e familiares.

Segundo colocado no ranking geral da pesquisa Veja São Paulo-Ipsos Marplan, o Santa Cruz é outro modelo de colégio que proporciona ótimas condições de trabalho aos professores. Depois de submetidos a um rigoroso processo seletivo, que inclui entrevistas e um teste específico criado pela escola, eles passam a integrar uma equipe diferenciada. Além de receber os mais altos salários do mercado, segundo um levantamento do Sinpro, realizado no ano passado, contam com cesta básica, plano de saúde e de previdência privada. Uma vez por semana, durante duas horas, participam de reuniões de planejamento – e são pagos pela tarefa. Nos encontros, discutem problemas dos alunos, debatem a interação de várias disciplinas e planejam as próximas atividades. "Temos uma preocupação muito grande com a formação global do aluno, não só com o conteúdo", diz a professora de matemática Ana Tomazia Cardoso. "Aqui no Santa, as coisas não são impostas", diz Danielle Skarbnik, de 16 anos, aluna da 2ª série do ensino médio. "Os professores nos levam a entender a razão de cada atividade que desenvolvemos. É uma diferença e tanto."

 

 

FIQUE DE OLHO

O professor deve estar próximo do aluno, mas isso não significa que os dois sejam iguais. "Hoje, todo mundo quer ser democrático e amigo", diz a psicopedagoga Raquel Whitaker. "Não podemos esquecer, entretanto, que ao professor cabe também fixar regras e impor limites."

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